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A Lâmpada da Tenda do Encontro

Vinde, caminhemos à luz do Senhor (Is 2,5)

Dom João Batista Buss, OSB.

 

Enquanto o povo de Israel peregrinava no deserto, o Senhor Deus deu muitas prescrições ao povo. Uma delas dizia respeito ao santuário, que consistia em uma tenda para abrigar a Arca da Aliança. O santuário e a Arca da Aliança foram construídos segundo o modelo prescrito pelo Senhor Deus. O santuário, por determinação divina, era o lugar do encontro com Deus. O livro do Êxodo relata o que Deus disse a Moisés sobre o Santuário: “Ali me encontrarei contigo e, de cima do propiciatório, do meio dos dois querubins postos sobre a arca da Aliança, te falarei tudo o que te ordeno a respeito dos israelitas.” (Ex 25, 22). Por isso o santuário recebeu o nome de Tenda do Encontro. Foi Moisés, o servo obediente de Deus, que assim a chamou: “Moisés tomou a Tenda e armou-a, fora, a certa distância do acampamento. Chamou-a ‘Tenda do Encontro’. Assim, todo aquele que buscava o Senhor saía até a Tenda do Encontro, fora do acampamento. Quando Moisés se dirigia à Tenda, o povo todo se levantava e permanecia à entrada de sua própria tenda, seguindo Moisés com os olhos até ele entrar na Tenda. E logo que Moisés entrava na Tenda, a coluna de nuvem descia e ficava parada à entrada da Tenda enquanto o Senhor falava com Moisés (...). O Senhor falava com Moisés face a face, como quem fala com seu próximo.” (Ex 33, 7-10.11a).

Havia também outra determinação a respeito da Tenda do Encontro. Moisés devia ordenar ao povo que trouxesse óleo para manter a luz de uma lâmpada no santuário. Assim diz o texto: “Ordena ainda aos israelitas que tragam azeite puro de oliva bem socada, para a iluminação, a fim de manter a lâmpada sempre acesa na Tenda do Encontro, do lado externo do véu, na frente do Testemunho. Aarão e seus filhos a manterão acesa desde a tarde até a manhã diante do Senhor: será um preceito perene, a ser guardado pelos israelitas, ao longo de suas gerações.” (Ex 27, 20-21).

Conectando estes textos com textos do Novo Testamento é possível tentar fazer uma leitura espiritual que oriente nossa vida hoje.

O Apóstolo São Paulo na Primeira Carta aos Coríntios questiona: “Não sabeis que vosso corpo é santuário daquele que habita em vós, o Espírito Santo que recebestes de Deus e que não pertenceis a vós mesmos?” (1Cor 6, 19). E na Segunda Carta aos Coríntios ele afirma: “Nós somos templos do Deus vivo...” (2Cor 6, 16). Portanto, a partir destes versículos das duas Cartas aos Coríntios podemos interpretar que também em nós deve haver uma lâmpada sempre acesa, uma vez que somos um santuário de Deus. Obviamente não se trata de uma lâmpada no sentido literal como aquela que havia na Tenda do Encontro, mas uma luz espiritual. Ora, se “o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado” (Rm 5, 5), então o amor de Deus presente em nosso coração é a luz que resplandece no santuário de Deus que somos nós.

No Antigo Testamento a Tenda do Encontro era assim chamada porque era o lugar o encontro com Deus. Nosso coração, órgão próprio da oração, é o lugar onde nos encontramos com Deus. Podemos dizer que nosso coração é a nova Tenda do Encontro. Manter a luz de Deus brilhando em nossos corações requer um trabalho. Da mesma forma como era tarefa do povo, segundo o Livro do Êxodo, a manutenção da lâmpada com “azeite puro de oliva bem socada”, assim também cabe a nós providenciar o azeite, ou óleo, para manter acesa a luz do amor de Deus presente no templo divino que somos nós. Todo o esforço ascético que fazemos para fixar bem a mente em Jesus (Hb 3, 1), conforme a Carta aos Hebreus, consiste em amassar bem o fruto da oliveira para produzir azeite puro que mantém a chama da lâmpada brilhando. Além disso, quando empregamos todo nosso esforço para correr “com perseverança na competição que nos é proposta, com os olhos fixos em Jesus, que vai a frente de nossa fé” (Hb 12, 1), também estamos produzindo um óleo puro que mantém acesa a luz em nossos corações, verdadeiros templos do Deus vivo. Quanto mais os nossos olhos e mente então fixos em Jesus, a Luz do mundo (Jo 8, 12), tanto mais a Luz, que é Ele mesmo, brilhará em nossos corações.

Portanto, a luz que brilha em nós é a própria presença do Espírito Santo que habita em nós. Quanto mais vivemos a partir disso, mais a presença de Divina resplandece, quanto mais estamos unidos a Jesus, tanto mais repletos de seu Espírito ficamos, a tal ponto que nós mesmos nos tornamos luz, como disse o Apóstolo São Paulo aos Efésios: “Outrora éreis trevas, mas agora sois luz no Senhor.” (Ef 5, 8). E ser luz no Senhor é algo capaz de transformar a vida de modo maravilhoso, pois ser luz no Senhor desemboca em comportamentos, em modo de proceder. Assim continua o Apóstolo “Procedei como filhos da luz. E o fruto da luz é toda espécie de bondade e de justiça e de verdade.” Como não lembrar aqui dos frutos do Espírito Santo? “O fruto do Espírito é: amor, alegria, paz, paciência, amabilidade, bondade, lealdade, mansidão, domínio próprio (...). Se vivemos pelo Espírito, procedamos também de acordo com o Espírito” (Gl 5, 22-23.25). Uma vida assim, segundo o Espírito, com certeza produz um azeito puro, de azeitonas bem socadas, que mantém a luz não só acesa, mas brilhante e resplandecente, capaz, inclusive, de iluminar os outros, pois Deus mesmo é luz. São João em sua Primeira Carta afirma claramente: “Deus é luz e nele não há treva alguma” (Jo 1, 5). Mas ele não afirma apenas isso. Ele deixa também muito claro que é o amor que nos mantém na luz que é Deus: “Aquele que diz estar na luz, mas odeia seu irmão, ainda está nas trevas. Quem ama o seu irmão, permanece na luz e não corre perigo de tropeçar”. (1Jo 2, 9-10). Portanto, é o amor que nos mantém na presença de Deus que é Luz. E, ao contrário, um coração repleto de ódio nos mantém nas trevas.

Penso que aquele preceito perene dado a Aarão e seus filhos de manter sempre a luz da lâmpada acesa na Tenda do Encontro (Ex 2, 21), consiste em amar, pois quem ama permanece na luz. É isso que deve ser guardado ao longo das gerações, pois o mandamento deixado por Jesus é este: “Este é o meu mandamento: que vos ameis uns aos outros, assim como eu vos amei (...). O que vos mando é isto: que vos ameis uns aos outros.” (Jo 15, 12.17).